O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o andamento da ação penal na qual um homem condenado por homicídio tentado, mas absolvido da imputação de homicídio consumado pelo Tribunal do Júri de São Paulo (SP), seria submetido a novo julgamento apenas pelo crime do qual foi inocentado. Em julgamento de apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou a realização do novo júri, marcado para o próximo dia 22/5, por considerar que o veredito absolutório foi manifestamente contrário às provas dos autos. O novo júri foi suspenso pelo ministro Fachin ao conceder liminar no Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 168796.
Na madrugada de 8/5/1998, em São Paulo, E.D.R. se envolveu numa briga de trânsito com jovens que saíam de uma festa de aniversário. De acordo com a denúncia do Ministério Público paulista, ao fazer uma manobra de marcha ré com sua caminhonete, E.D. atingiu uma jovem, que reclamou do ocorrido e passou a ser agredida pelo condutor. Um amigo intercedeu em favor da jovem e ambos correram, mas foram alcançados pelo motorista num ponto de ônibus e alvejados por tiros. O amigo morreu no local e a moça foi atingida, mas sobreviveu. O réu foi condenado pela tentativa de homicídio da jovem a quatro anos e quatro meses de reclusão em regime inicial semiaberto, mas inocentado da morte do amigo.
Para a defesa, a decisão do TJ-SP, ao anular a condenação, viola a soberania dos vereditos do júri. Além disso, a decisão não poderia determinar a realização de um novo júri somente em relação a um dos crimes imputados, no caso o de homicídio consumado, do qual E.D. foi absolvido. Segundo os advogados, uma vez reconhecida a nulidade de decisão proferida pelo Conselho de Sentença, não seria possível cindir o julgamento, pois ambos os crimes se deram em um mesmo local, na mesma data e sob o mesmo contexto fático. A defesa pediu liminar para suspender a realização do novo júri e, no mérito, requer que o acórdão do TJ-SP seja anulado a fim de que seu cliente seja submetido a novo julgamento por todos os fatos narrados na denúncia.
Em sua decisão, o ministro Edson Fachin destacou que a controvérsia que envolve a matéria é complexa e ainda não está pacificada. “Embora a tradicional jurisprudência do STF aponte para a compatibilidade entre o princípio da soberania dos vereditos e o juízo anulatório empreendido pelo Tribunal de Justiça em caso de decisões proferidas pelo Júri reputadas como manifestamente contrárias à prova dos autos, é certo que a questão está longe de se encontrar pacificada no âmbito doutrinário e jurisprudencial”, afirmou o relator.
O ministro citou recente decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que, por apertada maioria, os ministros entenderam que a absolvição do réu pelos jurados com base no artigo 483, inciso III, do Código de Processo Penal (CPP), ainda que por clemência, não constitui decisão absoluta e irrevogável, podendo o Tribunal cassá-la quando ficar demonstrada a total dissociação da conclusão dos jurados com as provas apresentadas em plenário. De acordo com o CPP, o Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido. Os quesitos devem ser formulados na seguinte ordem, indagando sobre: a materialidade do fato, a autoria ou participação, se o acusado deve ser absolvido, se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa e se há circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
Fachin também observou que a discussão sobre a questão exige análise mais detida também no STF, destacando entendimentos já expostos pelos ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa (aposentado) em que discutiram a questão relacionada ao poder de revisão dos tribunais de apelação versus a soberania dos vereditos do júri, além de recentes julgados da Primeira Turma do STF em sentido diverso à tradicional compreensão do tema (HC 126516 e RHC 122497). No caso em questão, ao deferir a liminar, o ministro Fachin também considerou relevantes os argumentos de que também haveria ilegalidade na determinação que desconstituiu apenas parcialmente o veredito. Além da possibilidade de haver tumulto processual, a defesa alegou que o réu já iniciaria o julgamento com a pecha de condenado, o que poderia condicionar a decisão dos jurados.
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